2025-01-17 IDOPRESS
Ministério da Fazenda em Brasília — Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo
GERADO EM: 16/01/2025 - 21:44
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O pós-pandemia foi positivo para países como Brasil e Estados Unidos. Em ambos,o ritmo de crescimento desde 2021 tem surpreendido os analistas e resultou de mudanças estruturais e de uma forte expansão fiscal,que não é sustentável. As taxas de desemprego caíram para os mínimos históricos.
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No entanto a forte expansão fiscal no Brasil e nos Estados Unidos no pós-pandemia originou novos problemas. Primeiro,trazer a inflação para a meta tem sido mais difícil do que se imaginava,com o agravante de que,no Brasil,diferentemente dos Estados Unidos,há uma desancoragem em curso das expectativas de inflação para os próximos anos.
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Segundo,inflação mais alta significa juros mais altos no curto prazo,e o desequilíbrio fiscal — representado por déficits nominais (receita menos a despesa,inclusive com o pagamento de juros da dívida) entre 6% e 8% do PIB nos próximos anos — impacta o custo de financiamento da dívida pública. Nos Estados Unidos,a taxa de juros de um título público indexado à inflação está em 2% real,ante zero ou negativo antes da pandemia e,se aproxima de 8% real,ante 3,5%,4% real no final de 2019.
Nos Estados Unidos,o crescimento da dívida pública não assusta ainda os investidores pelo papel único do dólar como reserva de valor mundial e o dinamismo da economia americana com investimentos em inteligência artificial (IA) e o impacto esperado no crescimento da produtividade. Esse não é o caso do Brasil e nem dos países da Zona do Euro.
No Brasil,nos últimos dois anos,tivemos crescimento acima de 3%,e estamos com a economia perto do pleno emprego,mas continuamos com as contas públicas no vermelho. Mesmo com o cumprimento das metas de primário (receita menos despesa sem juros da dívida) e das regras do arcabouço fiscal neste e nos próximos anos,a dívida pública bruta e líquida deverá crescer entre 12 e 14 pontos do PIB de 2022 a 2026. É um ritmo de crescimento excessivo em qualquer país.
A incerteza dos diversos analistas em relação à sustentabilidade fiscal no Brasil não é se o déficit primário neste ano será zero,25% ou 0,4% do PIB,mas sim se há alguma possibilidade de fazermos um ajuste fiscal de,no mínimo,R$ 250 bilhões ao longo dos próximos anos para estancar,em algum momento,o crescimento da dívida pública.
O governo poderá,com contingenciamentos e bloqueios do Orçamento,entregar a meta de primário neste e no próximo ano,mas não conseguiremos controlar o crescimento da dívida apenas “segurando” as despesas discricionárias,que são menos de 10% do Orçamento não financeiro do governo central e serão reduzidas ainda mais ao longo dos próximos anos,dado o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias.
Vários países do mundo estão debatendo medidas difíceis do lado da receita e da despesa para evitar que o crescimento excessivo da dívida pública atrapalhe o investimento,o crescimento econômico e a redução da pobreza. No Brasil,o debate é até mais urgente,porque já somos um país de renda média,mas com carga tributária (33% do PIB) muito acima dos nossos pares na América Latina (22% do PIB).
Mudanças de regimes especiais de tributação deveriam ser direcionadas,necessariamente,para aumentar a receita e o resultado primário. Não temos como,mesmo com compensação,criar programas novos ou aumentar isenções da receita dada a nossa precária situação fiscal. Teremos de rediscutir a vinculação de algumas despesas à receita,o crescimento da Previdência decorrente do crescimento real do salário mínimo e,mesmo assim,será necessário buscar mais receita.
Sem maior clareza de como resolveremos o nosso problema fiscal,corremos o risco de termos um par de anos com juros altos,inflação muito acima da meta,queda do investimento e do crescimento,colocando em risco a continuidade da redução da pobreza e da extrema pobreza no Brasil,apesar do crescimento do gasto público nas funções tipicamente sociais.
*Mansueto Almeida,economista-chefe do BTG Pactual,foi secretário do Tesouro Nacional