Investindo com fé: como um fundo de US$ 24 bilhões quer dar marca religiosa à gestão de empresas nos EUA

2025-01-06 IDOPRESS

Estante do fundo GuideStone em convenção de igrejas batistas nos EUA — Foto: Reprodução/X

RESUMO

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GERADO EM: 05/01/2025 - 16:45

"Investidores religiosos dos EUA direcionam US$ 500 bilhões para empresas conservadoras"

Fundo religioso de US$ 24 bilhões nos EUA busca influenciar empresas com valores conservadores,como se opor a políticas progressistas. Investidores cristãos querem usar US$ 500 bilhões para impactar corporações. Aumento de fundos baseados em fé reflete mudança política nos EUA. Coalizão visa direcionar investimentos de acordo com crenças religiosas,pressionando empresas e executivos. Movimento busca expandir influência e enfrentar esforços progressistas.

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Jim Lake,um cristão devoto no estado de Washington,disse que suas crenças religiosas sempre o fizeram se opor a práticas como aborto,transições transgênero ou pesquisa com células-tronco embrionárias. Mas até o ano passado,não passou pela cabeça do aposentado que ele poderia colocar seu dinheiro para trabalhar com sua fé.

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Um consultor financeiro mudou o portfólio de Lake para um punhado de fundos favoráveis à fé,um dos quais era administrado pela GuideStone Funds,uma empresa de investimentos de 106 anos do Texas que administra cerca de US$ 24 bilhões (R$ 148 bilhões) em ativos. A empresa atende aposentados batistas do sul dos EUA e,cada vez mais,investidores religiosos recém-ativos,como Lake e sua esposa.

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A GuideStone faz parte de uma coalizão nascente de investidores cristãos conservadores que estão começando a usar sua influência de acionistas para combater políticas corporativas progressistas,como financiar paradas do orgulho LGBTQIA+ ou cobrir os custos de viagem de funcionários por causa de abortos. Eles também estão de olho nos bancos por supostamente fecharem contas de clientes por motivos políticos e religiosos.

R$ 3,1 trilhões em vários fundos

Segundo algumas contas,há agora US$ 500 bilhões (R$ 3,1 trilhões) em investimentos espalhados por fundos privados conservadores baseados na fé e fundos de pensão estaduais que podem ser usados para influenciar o comportamento da empresa,disse Will Lofland,que supervisiona a defesa dos acionistas na GuideStone.

A confederação frouxa inclui a Inspire Investing,a maior gestora de fundos negociados em bolsa baseados na fé; tesoureiros estaduais republicanos e fundos de pensão de professores; e a Alliance Defending Freedom,um influente grupo jurídico conservador.

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À medida que atraem mais dinheiro,os membros da coalizão estão se reunindo com executivos corporativos e apresentando propostas de acionistas. Eles tiveram sucesso limitado até agora,mas pretendem construir seu bloco de apoiadores e mirar em mais empresas este ano,disse Lofland. Os investidores “querem honrar o senhor com todos os seus recursos”,continuou o executivo da GuideStone:

— Eles querem que seus dólares sejam investidos no que eles acreditam ser a maneira de honrar a Deus.

O investimento religioso existe há décadas,geralmente com foco em questões mais liberais,como direitos trabalhistas e mudanças climáticas. Mas fundos como o GuideStone foram encorajados pela mudança para a direita da política dos EUA e pela onda de ativistas e advogados conservadores que já pressionaram as empresas a restringir ou encerrar programas que apoiam esforços de diversidade,equidade e inclusão.

Anti-diversidade,igualdade e inclusão

Muitos apontam para o ativista anti-DEI (sigla em inglês para diversidade,igualdade e inclusão) Robby Starbuck,um cristão não denominacional,e seu sucesso em fazer com que empresas como Walmart,Toyota e Harley-Davidson recuassem em iniciativas — particularmente aquelas relacionadas a causas LGBTQIA+.

Entre os investidores comuns,há um interesse crescente em fundos baseados em religião,disse Tim Macready,chefe de investimentos globais em multiativos da Brightlight,que aconselha investidores sobre portfólios baseados na fé.

Os ativos em ETFs (os fundos negociados em Bolsa) e fundos mútuos favoráveis à fé ultrapassaram US$ 100 bilhões (R$ 615 bilhões) pela primeira vez no ano passado,de acordo com o estudo anual conduzido pela empresa.

A análise,compilada de 27 gestores de ativos baseados na fé,provavelmente captura apenas uma parte da atividade. O universo completo pode variar de US$ 200 bilhões (R$ 1,230 trilhão) a US$ 500 bilhões (R$ 3,1 trilhões),disse Macready. As entradas líquidas foram de 12% nos últimos três anos,disse ele.

Uma corretora passou de 200 consultores trabalhando com a GuideStone em 2021 para mais de 2 mil agora,disse Lofland. A Inspire disse que teve novos ativos líquidos de US$ 334 milhões no ano passado. Seu maior ETF,o Inspire 100,retornou 11,5% no ano passado,excluindo dividendos reinvestidos,com desempenho inferior ao ganho de 23% do S&P 500.

O maior fundo da GuideStone,o GuideStone Equity Index Fund,ganhou 20% no ano passado,com desempenho ligeiramente inferior ao do Índice S&P 500.

Investimento amigo da fé

Lake,um morador de 64 anos de Nine Mile Falls,Washington,investiu na GuideStone depois de conhecer um consultor cuja única prática é trabalhar com pessoas que investem em fundos favoráveis à fé:

— Isso realmente abriu meus olhos para a capacidade de permanecer amigo da fé e,ao mesmo tempo,ser competitivo.

A GuideStone opera em um prédio de escritórios com vista para uma rodovia no norte de Dallas,e manteve um perfil tão discreto que Lofland disse que não sabia sobre os fundos até se candidatar para trabalhar lá. A empresa administra principalmente investimentos de pensão para igrejas batistas,mas Lofland viu uma oportunidade de se tornar mais ativo.

Propostas de acionistas de grupos progressistas,alguns promovendo ideias como benefícios transgêneros contrários aos valores da igreja,começaram a proliferar há alguns anos,e a GuideStone não estava votando nas deliberações de conselhos de administração ou assembleias de acionistas para se opor a tais medidas,disse Lofland. Ele decidiu assumir o controle de como a GuideStone votava nas deliberações de empresas em vez de depender de consultores externos.

Um dos primeiros esforços do investidor foi no fim de 2023,quando apoiou uma proposta de acionista de um grupo conservador pedindo à Microsoft para relatar sobre lacunas de remuneração e benefícios entre gêneros,à medida que a empresa abordava o tratamento a questões reprodutivas e de gênero.

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A resolução obteve apenas 1% dos votos — a Bloomberg Intelligence diz que o apoio geral às propostas conservadoras em empresas dos EUA é de apenas cerca de 2%.

Lofland diz que é por isso que os fundos religiosos precisam construir um grupo maior de apoiadores,particularmente de fundos de pensão de estados conservadores.

Carta contra políticas de diversidade

Esses investidores já fizeram alguma agitação por conta própria: no ano passado,autoridades financeiras de 15 estados assinaram uma carta para empresas da Fortune 1000 em apoio ao fim dos programas de DEI. Coletivamente,eles administraram cerca de US$ 590 bilhões (R$ 3,629 trilhões),de acordo com dados do Censo dos EUA.

Esse tipo de poder de fogo é necessário para combater esforços que têm forte apoio progressista. Em julho,o controlador da cidade de Nova York,Brad Lander (que comanda um órgão semelhante aos tribunais de contas no Brasil,cujas atribuições incluem supervisionar a gestão dos fundos de pensão dos servidores da prefeitura),pediu a cinco grandes varejistas,incluindo Walmart e Costco Wholesale,que distribuíssem pílulas abortivas. Os fundos de pensão de servidores da prefeitura controlavam US$ 1,3 bilhão (R$ 8 bilhões) em ações dessas empresas,disse ele.

Uma coalizão de conservadores e investidores religiosos,incluindo Inspire e GuideStone,respondeu com sua própria carta no mês seguinte,dizendo que oferecer a pílula aumentaria o risco,mas representava apenas US$ 172 milhões (R$ 1,1 bilhão) em ações desses varejistas.

Lofland disse que a primeira iniciativa da GuideStone em 2025 será pressionar uma empresa financeira sobre a prática de "debanking" — o fechamento de contas de clientes que são consideradas pelos credores como riscos legais ou de reputação. Ele se recusou a nomear o banco.

A GuideStone já havia apoiado os esforços de outros grupos para pressionar o JPMorgan Chase & Co. depois que o credor foi acusado de fechar contas indevidamente para a organização sem fins lucrativos National Committee for Religious Freedom. Michael Fusco,um porta-voz do banco,disse que “nós nunca fechamos e nunca fecharíamos uma conta por motivos políticos ou religiosos,ponto final”.

A Inspire Investing e a Knights of Columbus estão entre outros investidores religiosos que trabalham para influenciar o comportamento corporativo.

A Inspire se juntou a um processo de 2023 movido por um grupo comandado pelo conselheiro do presidente eleito Donald Trump Stephen Miller contra a rede de supermercados Target,que acusa a varejista de custar bilhões de dólares aos investidores depois que sua venda de produtos LGBTQIA+ levou a um boicote do consumidor.

No mês passado,um juiz federal negou uma moção para rejeitar o caso e mudar seu local para fora da Flórida. A Target,que em resposta cortou produtos com temática LGBTQIA+ de algumas de suas lojas,se recusou a comentar.

A Inspire,que administra cerca de US$ 3,2 bilhões (R$ 19,7 bilhões),apresentou no ano passado quase duas dúzias de resoluções de acionistas sobre tópicos de DEI. Ela planeja apresentar mais em 2025.

— Como administradores do que acreditamos ser o dinheiro de Deus,é nosso trabalho falar a verdade bíblica ao poder corporativo — disse Robert Netzly,fundador da empresa de investimentos sediada em Meridian,Idaho.

Votar conforme conferência de bispos

O Knights of Columbus está trabalhando para desenvolver regras de votação por procuração que sigam as diretrizes estabelecidas pela Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos,disse Anthony Minopoli,presidente e diretor de investimentos da Knights of Columbus Asset Advisors,que administra cerca de US$ 28 bilhões (R$ 172 bilhões).

O grupo está fazendo parceria com a Busch School of Business da Catholic University of America no esforço,que visa fazer com que as dioceses católicas adotem as diretrizes para garantir que estejam votando com base nas crenças da igreja.

O grupo também provavelmente se envolverá com empresas em tópicos que vão do aborto à fabricação de minas terrestres e bombas de fragmentação,que violam os valores da igreja conforme estabelecido pela USCCB,disse Minopoli.

Mesmo que as coalizões de grupos conservadores e religiosos não obtenham forte apoio dos acionistas para suas propostas,elas provavelmente terão sucesso em influenciar executivos corporativos,de acordo com Amelia Miazad,professora de direito na Universidade da Califórnia em Davis,que está pesquisando um projeto sobre investidores baseados na fé.

Ela comparou os esforços à reação às estratégias ambientais,sociais e de governança (ESG),que viu gigantes da gestão de ativos,incluindo a BlackRock,maior gestora de recursos aplicados em ações do mundo,cortarem o número de novos fundos com esse mandato.

— Se sucesso significa silenciar o discurso corporativo sobre questões ambientais e sociais,então esses investidores serão tão bem-sucedidos quanto o movimento anti-ESG tem sido — disse ela.

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